Uma avaliação das pesquisas eleitorais em Belo Horizonte

As pesquisas eleitorais são recursos importantes para análise da evolução de campanhas e definição de estratégias eleitorais. Além do rigor metodológico, seus resultados devem ser analisados de modo cuidadoso. Os números apurados sempre estarão sujeitos a alterações por razões diversas desde o momento de sua apuração até a data efetiva do pleito. Na análise a seguir, vamos considerar quatro dimensões gerais: o cenário político do momento, o resultado da intenção espontânea, da intenção estimulada, as intenções de voto nulo/branco e os indecisos. Há outras dimensões relevantes como a rejeição dos candidatos, a estratificação dos resultados e a intenção de voto estimulado qualificado, que busca apurar o efeito sobre o eleitor da indicação de determinado candidato por alguma liderança política, como presidente, governador ou, no caso, ex-prefeito, que não serão aqui consideradas.

Foram consideradas as pesquisas realizadas pelo DataTempo (ago e jul/24), DataFolha (jul/24) e Quaest (jul/24) nos últimos 40 dias. O resultado da pesquisa AtlasIntel (ago/24) é também considerado nos gráficos abaixo, mas foi analisado em artigo específico devido à diferença metodológica.

Nas pesquisas de julho, apareciam ainda como candidatas as deputadas estaduais Bella Gonçalves- PSOL, que se tornou vice na chapa do deputado federal Rogério Correia – PT, e Ana Paula Siqueira – Rede, que retirou sua candidatura em seu apoio. A então candidata Luísa Barreto – Novo se tornou vice da chapa de Tramonte, assim como Paulo Brant – PSB tornou-se vice da chapa do presidente da Câmara Municipal de Belo Horizonte, Gabriel Azevedo – MDB. O deputado João Leite – PSDB retirou sua candidatura em apoio à reeleição do atual prefeito Fuad Noman – PSD. Esse, por sua vez, tem como vice em sua chapa o vereador apresentador Álvaro Damião – União Brasil. Até o momento, a candidatura do senador Carlos Viana – Podemos enfrenta um impasse com a definição da vice, inicialmente, a presidente estadual do partido, a deputada federal Nely Aquino, com quem teve uma briga pública, em virtude de ter preferência pelo cargo por Kika do Aglomerado da Serra.

Como se pode ver, o último mês foi período de acomodação política. O campo político liberal e ultraliberal entra na disputa eleitoral com 4 (quatro) candidatos: Tramonte, Engler, Viana e Fuad. O campo de esquerda convergiu em torno de Correia, não conseguindo unificar com Duda Salabert – PDT. A candidatura de Azevedo conseguiu o apoio do PSB, potencial aliado à esquerda. A viabilização de duas candidaturas de viés liberal/ultraliberal para o segundo turno representará um desafio para o campo de esquerda, mesmo que seja a de Fuad Noman, integrante do PSD cortejado pelo Presidente Lula, que fez aliança com o PSDB. Com o início oficial da campanha, certamente, as tendências apuradas pelas pesquisas recentes serão impactadas pela campanha oficial que se inicia. O quadro eleitoral começa a se consolidar a partir de agora.

A cerca de cinquenta dias do primeiro turno, o apresentador Mauro Tramonte – Republicanos aparece na liderança das pesquisas na disputa pela Prefeitura de Belo Horizonte. Na mais recente (Datatempo de 7 e 11/08/24), 27,6% dos entrevistados, quando estimulados, declararam pretender dedicar-lhe seus votos. O mesmo instituto apurou igualmente sua liderança entre 02 e 04/07/24 com 22,4% de intenções de voto.

Na pesquisa DataFolha (02 a 04/07/24), Tramonte aparece em 1º lugar com 19.0%. A melhoria de seu desempenho pode, certamente, ser atribuída aos apoios do Governador Romeu Zema – Novo, que indicou a vice da chapa, Luiza Barreto, e ao apoio do ex-prefeito de BH, Alexandre Kalil, que deixou o PSD para o Republicanos.

O apoio de Kalil já gerou atritos no primeiro momento. Adversário derrotado por Zema nas eleições para o Governo do Estado e tendo saído no último momento do PSD, partido pelo qual se elegeu e cujo vice busca a reeleição, o Partido Novo divulgou ‘nota afirmando que a intenção da sigla não era dividir palanque com o adversário nas eleições de 2022’. O ex-prefeito respondeu de pronto que a vice Luísa Barreto só está na chapa porque ele não vetou.

Os apoios a Tramonte são importantes para garantir a caminhada na liderança. Seu perfil conciliador, como tem sido descrito no mundo da política, converge para o perfil dos candidatos eleitos ao longo dos anos para a Prefeitura de Belo Horizonte como Patrus Ananias, Célio de Castro, Fernando Pimentel e Márcio Lacerda.

O deputado Bruno Engler – PL se candidatou para prefeito em 2020, ficando em segundo lugar com 9,95% dos votos, contra o então candidato Alexandre Kalil – PSD, eleito no 1º turno com 63,36% dos votos. Engler foi eleito vereador em 2016. É coordenador do Movimento Direita Minas Política e tem, como principal cabo eleitoral, o ex-presidente Jair Bolsonaro – PL.

Engler aparece em segundo lugar nas intenções de voto, com 10,8% na pesquisa DataTempo (07 e 11/08/24). O candidato está estatisticamente empatado com a candidata Duda Salabert-PDT, que foi lembrada por 10,1% dos entrevistados. Como a margem de erro estimada é de 2,83% para mais ou menos, os dois candidatos encontram-se na faixa de intenções de voto entre 7,27% e 13,6%.

Os resultados das demais pesquisas não são totalmente convergentes. A pesquisa Quaest registra para Engler 12,0% de intenções de voto no início de julho. De acordo com o DataFolha, ele tinha 7,0% das intenções igualmente no início de julho, o que representava a 6ª colocação, ainda que a margem de erro o colocasse empatado com os mais bem colocados. Vale destacar que o DataFolha se apoiou em uma amostra menor, realizando metade de entrevistas (616), comparativamente às outras pesquisas.

O desempenho de Engler mostra-se diretamente dependente da dinâmica que irá assumir o apoio de Bolsonaro a sua candidatura, diante dos apoiadores conquistados pelos demais candidatos liberais/ultraliberais. A escolha de sua vice, a ex-comandante da PM, Cláudia Romualdo, dentro do próprio PL, e o fato dela ser uma policial militar, confirmam as contingências que sua campanha enfrenta.

O atual prefeito Fuad Noman – PSD assumiu a Prefeitura de Belo Horizonte, após a desincompatibilização de Alexandre Kalil na campanha para o Governo do Estado em 2022. Apesar de ter ocupado cargos nas administrações de Aécio Neves e Augusto Anastasia, Noman ainda é desconhecido pela maioria do eleitorado. Fuad protagonizou duro embate com o vereador Gabriel Azevedo, também candidato, que envolveu o apoio de Marcelo Aro – PP, secretário de Romeu Zema, da Casa Civil, e a hoje deputada Nely Aquino – Podemos, então Presidente da Câmara Municipal, chegando a protocolar denúncia crime em 2023 por suposto abuso de poder, calúnia e difamação.

Noman aparece em 3° lugar empatado (8,7%) com Carlos Viana – Podemos (8,6%). Ambos se encontram na interseção da margem de erro de Salabert e Engler. O desempenho é pior do que há um mês atrás, quando chegou a 10,6% das intenções de voto (DataTempo). A pesquisa DataFolha registrou menor intenção de voto (6,0%) também há cerca de um mês para Noman.

A presença do apresentador Álvaro Damião na chapa, que conduz programa similar que Tramonte na TV Alterosa/SBT (Alterosa Agora), pode resultar em benefícios eleitorais, diante de um eleitorado popular, que tem apego a “notícias mais tristes e revoltantes de Minas e do Brasil”, como eles mesmos se auto-identificam. Com o apoio do PSDB, Cidadania, União Brasil, Solidariedade e o Partido Renovação Democrática – PRD, a candidatura tem potencial para crescimento.

Recentemente, Fuad Noman divulgou tratamento de um câncer raro, linfoma não Hodgkin. Esperamos que o tratamento não interfira em sua campanha.

O Deputado Federal Rogério Correia – PT carrega o desafio de superar o pífio desempenho eleitoral do partido em 2020, quando o jornalista Nilmário Miranda amargou 1,88% dos votos, em uma conjuntura completamente desfavorável. Desde o início de sua candidatura, trabalhou para ampliar as alianças. Dialogou com o PSD de Fuad, que esperou sinalização do Presidente Lula. Do mesmo modo, dialogou com a Deputada Federal Duda Salabert, sem conseguir que a aliança saísse do papel. Conseguiu o apoio do PSOL e da Rede, que retiraram as candidaturas de Bella e Ana Siqueira. Ambas, porém, vinham registrando baixa intenção de voto em torno de 1,0%.

O desempenho de Correia nas pesquisas tem se mostrado estabilizado. Na recente pesquisa DataTempo, registrou 7,8% de intenções, tendo registrado 6,8% na anterior. Na pesquisa Quaest, registrou 7,0% de intenções de voto. No DataFolha, 8,0%. Todos os desempenhos verificados encontram-se dentro da margem de erro dos candidatos imediatamente mais bem colocados.

Esse cenário, contudo, merece reflexão cuidadosa. Há na coordenação da campanha a expectativa de apoio ativo por parte do Presidente Lula, para decolar eleitoralmente. Apesar do apoio formal, tem-se mantido visivelmente contido, com um olho nos apoios para 2026 e outro nos resultados municipais, não só em BH, mas em outras capitais. Esse apoio proativo tem o potencial de alavancar o desempenho. Do mesmo modo, a militância petista e a trajetória política do partido na cidade são ativos que deverão contribuir , ao longo da campanha, para alavancar o desempenho do candidato.

A candidatura de Carlos Viana concorre diretamente com as demais do campo liberal/ultraliberal, com pouca chance de protagonismo. Nas pesquisas analisadas, manteve-se no patamar de 8,0% das intenções de voto. Não contando com o apoio das principais lideranças políticas, seu desempenho é uma incógnita, desgastado ainda pelo embate dentro de seu partido com a presidente de seu partido e, nesse caso, com a família Aro, que tem grande influência em Belo Horizonte.

O vereador Gabriel Azevedo protagonizou em 2023 diversos episódios, visando dar visibilidade ao seu mandato de vereador e presidente da Câmara, já buscando se credenciar como candidato a prefeito. A baixa intenção de voto, a falta de uma clara definição ideológica de sua candidatura e igualmente de apoios relevantes, e o próprio desgaste de seus embates com o Fuad Noman, o que chegou a gerar seu pedido de impeachment, indicam baixo capital político, para alcançar desempenho mais favorável.

A maioria dos eleitores não dá importância à pesquisa espontânea. Ela, contudo, é rica para explicar o potencial e a dinâmica possível de desempenho dos candidatos. Na pesquisa espontânea, não são apresentados nomes dos candidatos e o entrevistado declara o nome que imediatamente lhe vem à lembrança, no momento em que é perguntado em quem pretende votar. Essa lembrança imediata possui um valor diferenciado na qualificação da intenção de voto em relação àquela por indicação/indução, porque está fundamentada em razões que o eleitor acumulou e consolidou consigo até aquele momento no seu mundo da vida.

Do ponto de vista racional, o desejável em uma esfera pública idealmente estruturada em termos de envolvimento do cidadão na vida pública, assim como de um sistema eleitoral capaz de maximizar a aproximação do eleitor dos agentes políticos seria que a intenção manifestada espontaneamente e a estimulada dos eleitores potenciais apresentassem resultados convergentes. Isso não ocorre no Brasil. Assim, a proporção de intenções manifestadas espontaneamente antes das eleições de nomes de candidatos em relação aos eleitores que desconhecem candidatos, neste caso, os ‘indecisos’, é muito baixa. Sendo assim, as intenções de voto irão se transmutar profundamente durante a campanha.

Para Mauro Tramonte – Republicanos, que lidera a intenção estimulada de votos, a intenção espontânea é de 5,4%, o 2º mais citado pelos entrevistados na última pesquisa DataTempo. Há cerca de um mês, era lembrado por 3,0%. Nas pesquisas Quaest e DataFolha, o desempenho foi similar com, respectivamente 2,0% e 4,0% das intenções de voto.

A distância para o resultado estimulado de 27,6% é grande. Quando seu nome é mostrado, os respondentes passam a se lembrar de sua figura enquanto apresentador de programa de televisão, que aparece diariamente para milhares de pessoas abordando diversos problemas de serviços urbanos e sociais, que entendem serem suficientes para qualificá-lo para a disputa eleitoral.

A desproporção entre os resultados espontâneo e o estimulado de Tramonte demonstra, de um lado, o reconhecimento da imagem pública do candidato que se credencia por sua narrativa sobre acontecimentos de violência policial e de carência e ineficiência de serviços públicos. Do outro, mostra igualmente a volatilidade do nome do candidato , que não é considerado imediatamente por méritos próprios como candidato possível a prefeito.

Em primeiro lugar, na intenção espontânea de voto, aparece o atual prefeito Fuad Noman – PSD, que registra 5,8% das preferências. Ela decaiu em relação à pesquisa DataTempo anterior (7,1%), o que pode ser explicado pela perda de apoio de Alexandre Kalil. Ao contrário de Tramonte, a distância em relação à intenção estimulada (8,7%) é bem menor. Neste caso, Noman aparece em 4º lugar, empatado com outros candidatos. Vale lembrar o esforço que o candidato-prefeito declarou estar fazendo para se tornar conhecido, já que era vice na chapa de Alexandre Kalil. Considerando-se os apoios eleitorais conquistados já analisados anteriormente e levando-se em conta o próprio desempenho ao longo da campanha, a intenção espontânea de votos em Fuad mostra que ele é competitivo.

O candidato Bruno Engler – PL foi igualmente lembrado espontaneamente no mesmo patamar por 5,3% dos entrevistados na enquete DataTempo realizada em agosto. Nas demais pesquisas, a lembrança registrada foi um pouco abaixo: Quaest – 3,0%, DataTempo = 4,8% e DataFolha = 3,0%. Sinaliza a melhoria de seu nome junto ao eleitorado. Em comparação ao seu desempenho na estimulada de 10,8% na pesquisa mais recente, é possível vislumbrar maior apelo do nome quando mencionado, em razão de suas orientações ideológicas.

A intenção de voto espontânea no candidato Rogério Correia encontra-se em um patamar baixo de 2,5%. De acordo com as pesquisas anteriores verifica-se que ela melhorou, tendo estado em 1,6% (DataTempo, julho) e 1,0% (Quaest). Quando comparado com as intenções estimuladas, vemos que o candidato apresenta desempenho cerca de 3 vezes melhor, igualmente confirmando seu reconhecimento de sua orientação política.

O candidato Carlos Viana – Podemos registrou espontaneamente apenas 1,1% das intenções de voto. Em julho, registrou, na pesquisa DataTempo, 0,9%. Nas pesquisas Quaest e Datafolha, não foi lembrado, o que confirma as dificuldades analisadas acima para alavancar sua candidatura.

Dentre todos os resultados relevantes apurados nas intenções espontâneas de voto, está a magnitude de indecisos e do contingente dos que declaram que votarão em branco ou nulo. O número de indecisos é impactante: 55,3% na pesquisa DataTempo de agosto. Na anterior, era mais alta: 63,8%. A pesquisa da Quaest registrou 83,0% de indecisos em julho e a do DataFolha, 73%! Os que declararam pretender anular o voto ou votar em branco acumulam 18,2% dos entrevistados no DataTempo.

A intenção espontânea de voto mostra o real estágio de cristalização das preferências eleitorais. A campanha oficial em Belo Horizonte se inicia com um patamar bastante baixo de definição das candidaturas, deixando em aberto a disputa entre os candidatos que desfrutam de apoios consistentes e tenham inteligência para apresentar seu projeto de governo nos próximos 45 dias.