O acordo feito em 2016, com as mineradoras Samarco, Vale e BHP Billinton, para a reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, MG, está na fase final de repactuação, com valor superior a 100 bilhões de reais. O acordo de 2016 foi muito comemorada pela Advocacia Geral da União e pelas Advocacias Gerais dos Estados de Minas Gerais e do Espírito Santo, quando se desconhecia a extensão dos danos provocados pelo crime ambiental. Além disso, todas as ações previstas foram elaboradas pelos órgãos públicos federais e estaduais, principalmente os da área ambiental. Estabeleceu-se, na ocasião, que a execução se daria por meio de uma fundação do direito privado, a Renova, controlada pelas mineradoras e supervisionada por um comitê interfederativo. Ao longo dos anos, as mineradoras questionaram as decisões do comitê e judicializaram inúmeras questões, sob a vista inoperante do Estado.
O ambiente de incertezas, próprio de desastres dessa magnitude, encorpado pela continuidade do dando ambiental, social e econômico, chegou, nove anos depois de ocorrido, a uma situação complexa e insustentável. Daí que a repactuação pode significar um novo ciclo, onde a função do governo federal e dos governos dos estados de Minas Gerais e do Espírito Santo e dos 49 municípios atingidos será definidora sobre os rumos da almejada reparação integral. Isso porque a maioria das ações necessárias e ainda não realizadas serão incorporadas às políticas públicas. Antevejo, no entanto, que se essas forem definidas e implementadas apenas pela burocracia governamental, terão tudo para não atingir os resultados.
O esboço divulgado pelo Governo Federal, antes da assinatura do acordo que deverá ocorrer nos próximos dias, além da crítica das lideranças das pessoas atingidas, principalmente em relação aos valores previstos para indenizações individuais, carece de detalhamento, para que a sociedade conheça e interaja, possibilitando que as políticas públicas nas várias áreas (saúde, meio ambiente, projetos de desenvolvimento econômico) sejam fruto de deliberação das comunidades atingidas.
Na literatura disponível sobre os desastres, a participação e o controle social, que começam com o acesso à informação esclarecida, são a chave para o sucesso das ações de reparação.
Reconheço que o Governo Federal anunciou a pretensão de criar um Conselho Federal de Participação Social da Bacia do Rio Doce, mas restrito a um dos programas previstos no acordo a ser assinado. O grande salto será estender essa governança para todas as ações do acordo, em nível federal e dos estados. Aí sim, seria um modelo internacionalmente inovador, diferente daquele modelo acanhado e elitista que foi previsto em 2016.