Formou-se a opinião errônea de que o Governo Fernando Pimentel/PT (2015-2018) foi o responsável pela crise financeira, que afetou os pagamentos da Administração do Estado de Minas Gerais a partir de 2015. Independente dos desacertos incorridos pela Administração Pimentel na gestão da folha de pagamento e em relação aos pagamentos às prefeituras no final do mandato, não há dúvida de que a crise começou bem antes e que foi o Governo Antônio Anastasia/PSDB (2011 -2014) quem entregou ao seu sucessor as contas em situação de calamidade financeira.
O Governo Fernando Pimentel herdou uma crise cultivada ao longo dos Governos Aécio Neves/PSDB (2007-2010) e Anastasia (2011-2014) de modo dissimulado. Na verdade, a crise fiscal mineira tem origem nas contas gravemente desequilibradas ainda no Governo Eduardo Azeredo/PSDB (1995-1998) no contexto do ajuste monetário e fiscal promovido pelos Governos Fernando Henrique Cardoso/PSDB (1995-2002), que levou à extinção dos bancos estaduais (BEMGE, Credireal e Minascaixa), à edição da Lei nº 9.496/96, que gerou uma longa e pesada dívida paga pelos estados até hoje em consequência do saneamento, e da LC nº 87/96 (Lei Kandir), que desonerou a exportação de produtos primários da incidência de ICMS – Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços, reduzindo as receitas, no caso, de Minas Gerais, exportador de café, gado e minério de ferro – uma longa e complexa história a ser tratada em outra oportunidade. Ambos os Governadores gerenciaram o desequilíbrio continuado, buscando transmitir para a opinião pública a sensação de controle financeiro, em sintonia com o alinhamento ideológico do Governo Fernando Henrique e da busca de legitimidade eleitoral.
Os Governos Aécio e Anastasia valeram-se das porosidades da gestão fiscal brasileira, da leniência do Poder Legislativo, da flexibilidade da regulação das estatais, dentre outros artifícios, assim como do boom das receitas tributárias e da oferta generosa de empréstimos no período de seus governos, para administrar os efeitos do desequilíbrio fiscal de forma pontual e ineficaz do ponto de vista sistêmico. Chegaram a difundir inadequadamente o marketing do ’déficit zero’, Entretanto, sustentar a fake news de contas equilibradas, cometeram impunemente vários abusos como a maquiagem dos gastos com saúde para fins constitucionais, extinção do Fundo de Previdência do Estado de Minas Gerais e a edição da famigerada LC 100/2007, declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal-STF em 2015 (ADI 4876), que efetivou, sem concurso, mais de 50 mil profissionais de educação, para não se pagar INSS pelos profissionais contratados temporiamente.
O fato é que, em 2014, último ano do mandato, o balanço oficial do Governo Anastasia fechou o exercício com déficit de cerca de R$ 2,165 bilhões, além de esconder déficit por meio da anulação de empenhos no valor de R$ 1,1 bilhão. Esta situação corresponde, de fato, a um déficit de cerca de R$ 4,3 bilhões, se considerarmos a resultante das medidas citadas para a solução predatória e artificial do déficit. Conforme mostra a tabela abaixo, se ‘retirarmos’ da contabilidade oficial os efeitos das soluções pontuais implementadas pelos governos pessedebistas, vemos a real gravidade da crise ocultada ao longo dos anos, que chegou a atingir em 2013 um déficit oculto estimado de quase R$ 11,0 bilhões!!! Diante da gravidade da situação não assumida publicamente, o então Governador Anastasia promoveu a extinção do Fundo de Previdência do Estado de Minas Gerais – FUNPEMG em 2013, que rendeu imediatamente cerca de R$ 3,5 bilhões de receita complementados com o fluxo financeiro de empréstimos disponibilizados naquele ano. Esta realidade, porém, não foi reconhecida pela imprensa mineira e nacional, as quais não denunciaram expressamente a responsabilidade daqueles governos. Tampouco o movimento sindical dos servidores estaduais chegou a compreender a gravidade da situação fiscal naquele momento.
Revisão da Proposta de Orçamento 2015
Neste contexto, o Governo Pimentel, nos primeiros meses, identificou e deu publicidade ao cenário de crise ainda no mês de abril, com a revisão do orçamento para 2015 – que deveria ter sido aprovado ainda em 2014. Com isso, deu visibilidade ao déficit de R$ 7,2 bilhões que estava previsto para aquele ano e que tinha, portanto, sido ocultado pela gestão anterior. Apesar disso, a opinião pública, políticos, imprensa, cidadãos, servidores atribuíram ao Governador Fernando Pimentel – e, consequentemente, ao Partido dos Trabalhadores, a responsabilidade pela geração da crise, que não foi ele quem criou. Deixaram de lado qualquer responsabilização do Governador Augusto Anastasia– aliás, recém-indicado para o Tribunal de Contas da União – TCU, que, deliberadamente, escondeu a grave realidade das contas do Estado de Minas Gerais.
Na sequência, o Governo Pimentel foi levado a tomar uma série de medidas para administrar o déficit crescente e a regularidade dos pagamentos. Decretou calamidade financeira. Alterou o calendário de pagamento de salários, que passou a ser feito em duas parcelas no mesmo mês. Em virtude da conjuntura política vigente que produziu um ceticismo insano na opinião pública e, certamente, devido a encaminhamentos pouco cuidadosos do Governo como a divulgação mal feita das datas de pagamento e o tratamento diferenciado da categoria de segurança pública em torno dessa medida, foi gerada uma insatisfação desproporcional do funcionalismo. Acabou por prevalecer a interpretação de ‘parcelamento’ de salários, embora eles fossem pagos dentro do mês e embora o critério de corte de R$ 2.000 para pagamento da primeira parcela, que acontecia nos primeiros dias do mês, beneficiasse cerca de 60% dos servidores.
O Governo Pimentel buscou, desde o início, administrar a crise com soluções de receitas extraordinárias e de administração do fluxo de despesas. Obteve os recursos dos depósitos judiciais. Vendeu a folha de pagamento. Conseguiu postergar o pagamento de parcelas da divida com a União. Contudo, a conjuntura política nacional sofreu forte tensionamento ao longo do per do mandato, culminando com o início do processo de impeachment da Presidente Dilma Roussef em dezembro daquele ano 2015, além da intensificação no período do lawfare generalizado inclusive contra o Governador Pimentel. A eventual ênfase do reconhecimento da crise financeira de Minas Gerais representava um risco de se agravar a estabilidade do Governo. Assim, somente, em novembro de 2016, o Governo viria a decretar estado de ‘calamidade financeira’, com o apoio dos Poderes Legislativo e Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública. A intensificação da crise política dificultou a viabilização de soluções complementares de receita extraordinária no último ano de mandato, como a abertura de capital da CODEMGE – Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais e a securitização da dívida tributária. Com isso, o Governo Pimentel acabou deixando de fazer aos municípios, dentre outros, os repasses do FUNDEB – Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica, comprometendo suas chances de reeleição.